Ritual


a música irresistível e frenética preenche

a África de cada um se manifesta 

se expõe sem preconceito

não há cor de pele

apenas a revolução dos corpos 

na batida grave do surdo 

 

não há a lucidez da razão

sequer os limites do pudor

apenas o movimento primordial

o instinto que rompe

o êxtase que seduz

a sedição que enlouquece

 

a tribo dança à vertigem

mesmo sem sacerdotes ou lanças

no ritual do despojo

esvaem-se as dores que não transformam 

na gira que o som embriaga

tomados pelo transe da entrega

 

baquetas retinem no couro

goelas estrídulas mais gritam que cantam

as vozes selvagens expelem a angústia

o que dizem pouco importa

se o ritmo prenhe domina o pensamento

e ocupa cada vão onde a dor atalaia 

 

os corpos se exaurem no frenesi

enrouquecem as gargantas sôfregas

os pés sangram na cadência sincopada

cansados da ginga insana do corpo

se o palco não se calasse 

jamais haveria o fim desta noite tribal