O ócio e a espera


sentado na praia os olhos espicham à curiosidade que se atreve                        

mesmo porque contemplar é o que apenas resta ao ócio ungido pela razão

com a bunda em uma espreguiçadeira assisto tedioso ao entardecer

a noite recorrente e qualquer traz a brisa que suaviza o ardor da pele

 

na tocaia do promontório a luz do farol pulsa e cega a cuia celeste

e de instante a instante perco as estrelas na mira dos olhos apertados

um reflexo de fotografia incide sobre a monotonia da água

clichê tão inevitável e comum como um postal de banca de jornais

 

se o óbvio não interessa e está lá apenas por estar como estão outras coisas

a indolência que me toma faz parte desse cenário e não o pensar

a letargia insistente resiste à vontade pálida e amolengada

e me deixo num afrouxo como um saco de batatas à toa em um canto 

 

aí o pensar incomoda e se limita ao olhar sutil que percorre a praia

nada além de um jeito dissimulado como se nunca houvesse este olhar

sandices do ócio que sente seu fim na noite inevitável que me acolhe 

o que resta eu ouço das ondas que quebram, calado o burburinho avesso

 

se nem sempre o oceano ordinário espalha suas fraldas nas areias inocentes

vez ou outra vejo sua fúria incontida nos rochedos daquele farol

impossível banalizar beleza tamanha mesmo à indolência no mormaço

aos poucos as pessoas tomam um rumo e retomo a condição do pensar