O elétrico


viajo para colher histórias

apanho as que me seduzem 

mesmo quando os olhos enganados pela alma mentem

apanho estas também 

 

à beira do Tejo miram o imaginário

num lago dourado de luzes não fosse uma foz 

águas a se despejarem no Atlântico

aquelas que descidas d' Espanha

encontram as que se quebram nas falésias de Portugal

 

a cidade do alto também mira o Tejo

não com a glória da insensatez dos navegantes do res

mas com as luzes dos poetas que sonharam o além

a imensidão das águas sempre pulsou no coração português

 

deixo a Lisboa dessas bandas do Tejo 

mas reluto em trazer a alma que insiste em ficar

tomo o elétrico ainda com os olhos perdidos

e subo pela diagonal incerta e quebrada 

a varar os intestinos do talude

na ginga sem graça do desalinho dos trilhos

 

as vielas se entrecruzam nas luzes e sombras da tarde lisboeta 

na linha que o elétrico então fiandeiro tece na cidade

e se contorce pelos chãos antigos e estreitos

vez ou outra uma escadaria rompe a ala das paredes

e sempre algum largo desfaz a opressão dessas paredes que debruçam

 

na Estrela a catedral calada espera o elétrico na parada

na sua penumbra abriga o corpo da Carlota Joaquina

seu desprezo pelo meu chão apenas me leva a pensar 

mas a grandeza de Pessoa no Campo d’Ourique apequena esses pensamentos

o 28 chega ao portão dos Prazeres a persistir no tempo que o abriga