Os Reis Magos


reviver as profecias de Seth nas janeiras cantadas pelas levas

escancarar as portas e janelas não só pelos novos ares que sopram 

aguardar ao menos a vã esperança que o anterior perdeu na caminhada

deixar nas ruas as cinzas do adeus para serem expurgadas no Tejo

 

assumir a fé como estrela guia não o acaso da sorte que desmerece 

a mesma estrela que na anunciação avocou aqueles que acreditaram

quantos seguem esses passos se creem sem as dúvidas que arbitram o homem

Gaspar, Baltazar e Melchior deixaram-se ao caminho pela profecia

 

Gaspar se jovem, das bandas do Cáspio, à beira das aguas interiores

Baltasar, o mouro, da Arábia imensa de desertos áridos e ardentes 

Melquior, um ancião caldeu do reino de Ur, já alquebrado na peregrinação

mais sábios e eruditos do que simples reis limitados ao chão dos pés

 

palavras soltas no ar são dispersas, jamais emudecem se lançadas

não como a seta atirada, que sempre mesma, encontra o destino distante

e se a fé importou, então se fez arco da palavra lançada pois seta

entre as estrelas da noite oriental seguiram a que Seth arremessou

 

nos arredores da aldeia, José e Maria no resguardo de um presépio 

longe da soberba dos arcos e abóbodas, nada além do chão batido e tosco 

era suficiente a noite ponteada, domo celeste sobre as cabeças 

e a Luz simples e divinal nos braços de Maria de Jerusalém

 

o anúncio da vinda do Salvador clamada desde os tempos primordiais

viajou pelos caminhantes a errar pelas terras áridas do oriente 

passando por aquelas de Dario e Alexandre e depois de Otávio Augusto

de tantos outros que sequer ouviram o pregar dos profetas ao povo

 

em um canto da sala está o presépio e a memória basta como oração

a imagem de cera e madeira trouxe junto gerações de devoção 

e repousa na palha do desvelo coberto por um trapo de linho

qual pecado o pintinho do Menino Jesus traria à sua nudez?

 

quisera a mesma fé que levou os reis magos à certeza do encontro

e percorreu um infindo tempo até aquele canto iluminado da sala 

e na serenidade do presépio debruço sobre esta longa história

então esqueço a agonia dos dias que deveriam iluminar os homem